quarta-feira, 2 de julho de 2008

Teu espelho





Siga em frente. Vire à esquerda, depois à segunda à direita. Faça o retorno, e pegue a direita. Quando passar a ponte, vai encontrar uma rua de paralelepípedos. Vá até o final. Atravesse a avenida, e no terceiro farol vire à direita. Pegue a segunda à esquerda, e novamente a primeira à esquerda. Siga até o fim. Quando chegar numa rua de terra, siga em frente. Na última rua à sua esquerda, vire outra vez. Passe uma casa branca, depois outra verde. A minha casa é amarela, com portões de madeira.
O cão não morde. Pode entrar. Estarei na janela, com o vidro fechado à sua espera.
Tenho cabelos longos e alourados, estarei com uma camisola preta e transparente.
Se quiser, quando chegar, ponho minhas meias pretas com cinta liga e o par de botas... Será que você vai gostar?
Ou me visto de branco, encarnando a pureza, você me olha, eu abaixo meus olhos. Você escolhe.

Deixarei uma rosa vermelha na janela, pra que saiba que estou só. Venha quando puder. Estarei sempre ali, sem nada a fazer, a não ser esperar.
E quando chegar, vai querer meu corpo belo, mas cansado, de tanto esperá-lo.
Mas de nada adianta, porque daqui onde estou, nada mais posso fazer.Não sofro, nem choro e nem me alegro. Fico inerte e tranqüila.
E quando você realmente chegar, verá.

Que estive, estou e estarei sempre aqui , entre dois espelhos, lendo os sonhos de todos os homens. Com um olho aberto e outro fechado, retribuo olhares esguios, pensamentos obscuros e sombrios que um dia me fizeram cegar.

Eu sou o sonho, a fantasia de todos, e todos homens, comigo querem deitar-se. Eu mudo o tempo todo, mas permaneço no mesmo lugar.

De um lado, sou cega. Olhe o reflexo de seu próprio olhar. De outro, estou à espreita. Mostro-lhe o que jamais quis enxergar.

Se quiser me encontrar, sabe onde moro. Eu moro aqui, deste lado do espelho, e estou a sua espera, pra vir me buscar.






(Um delírio antigo, escrito em 2006)




segunda-feira, 30 de junho de 2008

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Quando me toca, penso
naquilo que sinto e não falo
Mãos precisas, ternas
tornam-se brutas
Estapeiam-me
Silenciando minha alma
para ouvir teus pensamentos castos.

As imagens fora de foco falam mais...

















do que palavras

borradas...




domingo, 29 de junho de 2008

Uroboro




De tudo que eu li sobre o Uroboro, duas histórias foram as que mais me comoveram.


" ...a doce Lily quedava-se imóvel, olhando fixamente o cadáver sem alma(...) No seu mudo desespero, não procurou ajuda, porque não conhecia nenhuma ajuda. A serpente ia se aproximando cada vez mais(...) Com o seu corpo flexível descreveu um círculo largo a volta do corpo e abocanhou com os dentes a ponta da cauda, e ali permaneceu imóvel."


Numa citação de outra citação, de um outro que citava, dizia que isto foi citado em uma obra de Goethe, datada de 1795.


"Desde que Vulcano acendeu a roda mercurial da angústia, na qual a alma se tinha imaginado, "o seu sentido só subsiste de acordo com a multiplicidade das coisas naturais". Ela está inteiramente submetida ao jogo mutável das paixões.


A alma iluminada aconselha a pobre alma a destruir as larvas da serpente mosntruosa que tem em si, e a encaminhar-se para Cristo, o espírito do amor, que, feito carne, quebrou as portas do Inferno e voltou a abrir o caminho do Paraíso."
( J. Böhme, Theosophische Werke, 1682, citado em Alquimia e Misticismo, por Alexander Roob.)


Quando comecei a me encantar por estas formas, repeti de todos os modos que consegui. Só uma coisa me resta dizer a respeito:

"De tanto ele querer andar na minha frente, acabou ficando prá trás."

E agora posso entender como isso pode acontecer.

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